523.

Na Oração, que desaterra

"Na oração, que desaterra................................... a terra,
Quer Deus que a quem está o cuidado.................. dado,
Pregue que a vida é emprestado.......................... estado,
Mistérios mil que desenterra................................ enterra.

Quem não cuida de si, que é terra,........................ erra,
Que o alto Rei, por afamado................................. amado,
É quem lhe assiste ao desvelado........................... lado,
Da morte ao ar que não desaferra........................ aferra.

Quem do mundo a mortal loucura........................ cura,
A vontade de Deus sagrada.................................. agrada
Firmar-lhe a vida em atadura............................... dura.

Ó voz zelosa, que dobrada.................................... brada,
Já sei, que a flor da formosura............................. usura,
Será no fim desta jornada.................................... nada.
"
Gregório de Matos Guerra

522.

"Odeio quem me rouba a solidão sem, em troca, me oferecer verdadeira companhia."
Nietzsche
enviada por Diego Muñoz

521.

"Se não me bastassem problemas de amor
Papéis importantes confundem a mente
É gente correndo é conta corrente
Corrida do ouro, progresso, sucesso
Meu peito poeta rejeita esse jeito
E vai enfeitado de amor o meu verso
Entenda meu samba seja como for
Que eu vivo na vida
Correndo pro amor

Mas não sou Deus
Pra ter de perdoar"
João Nogueira, da música Meu Canto Sem Paz, em parceria com Gisa Nogueira

520.

"O poema é antes de tudo um inutensílio"
Manoel de Barros

519.

"tudo que permanece, fundam-no os poetas"
Friedrich Hölderlin

518.

"A arte de amar é a mesma de ser poeta."
Cecília Meireles

517.

"O real não se pronuncia, ele é pronunciado desde um princípio que o desconhece pretendendo conhecê-lo."
Antonio Jardim, do texto Quando a Paixão é Filosofia

516.

"Em uma guerra não se matam milhares de pessoas. Mata-se alguém que adora espaguete, outro que é gay, outro que tem uma namorada. Uma acumulação de pequenas memórias..."

Christian Boltanski, frase citada no documentário "Nós que aqui estamos, por vós esperamos"

515.

"Os homens criam as ferramentas, as ferramentas recriam os homens."

Marshall McLuhan, frase citada no documentário "Nós que aqui estamos, por vós esperamos"

514.

"Sem olhos, sem nariz, sem boca, a aranha responde
unicamente aos signos e é atingida pelo menor signo que
atravessa seu corpo como uma onda e a faz pular sobre a presa."
Gilles Deleuze, Proust e os Signos

513.

O Poeta

"Olhos que recolhem
Só tristeza e adeus
Para que outros olhem
Com amor os seus.

Mãos que só despejam
Silêncios e dúvidas
Para que outras sejam
Das suas, viúvas.

Lábios que desdenham
Coisas imortais
Para que outros tenham
Seu beijo demais.

Palavras que dizem
Sempre um juramento
Para que precisem
Dele, eternamente."
Vinícius de Moraes

512.

A Mulher e a Casa

"Tua sedução é menos
de mulher do que de casa:
pois vem de como é por dentro
ou por detrás da fachada.

Mesmo quando ela possui
tua plácida elegância,
esse teu reboco claro,
riso franco de varandas,

uma casa não é nunca
só para ser contemplada;
melhor: somente por dentro
é possível contemplá-la.

Seduz pelo que é dentro,
ou será, quando se abra;
pelo que pode ser dentro
de suas paredes fechadas;

pelo que dentro fizeram
com seus vazios, com o nada;
pelos espaços de dentro,
não pelo que dentro guarda;

pelos espaços de dentro:
pelos recintos, suas áreas,
organizando-se dentro
em corredores e salas,

os quais sugerindo ao homem
estâncias aconchegadas,
paredes bem revestidas
ou recessos bons de cavas,

exercem sobre esse homeme
feito igual ao que causas:
a vontade de corrê-la
por dentro, de visitá-la."

João Cabral de Melo Neto

511.

Escapulário

"No Pão de Açúcar
De Cada Dia
Dai-nos Senhor
A Poesia
De Cada Dia"

Oswald de Andrade

510.

"O litoral e as praias do Brasil têm algo a acrescentar à história mundial da canábis. Nas águas brasileiras, o navio Solano Lopez, em 1988, descarregou 20 mil latas de maconha prensada, ao se sentir perseguido pela polícia. A maconha vinha da Austrália, e seu destino final era os Estados Unidos. As latas, cada uma contendo 1,3 quilo de maconha prensada, se espalharam por vários estados e chegaram à Ipanema. Celebrou-se ali o que se convencionou chamar o Verão da Lata. A expressão "da lata" tornou-se sinônimo de boa qualidade e foi título de um CD da cantora Fernanda Abreu."
Fernando Gabeira, Folha Explica A Maconha
p.43 

509.

Infelizmente não foi possível postar. Ajude-nos!

508.

"E  agora, serei chamado de dependente e serei levado daqui preso?"
Evo Morales, em reunião da Onu, enquanto mascava folha de Coca

507.

"O tédio existe em função da vida sob a coação do trabalho e sob a rigorosa divisão do trabalho. Não teria que existir. Sempre que a conduta no tempo livre é verdadeiramente autônoma, determinada pelas próprias pessoas enquanto seres livres, é difícil que se instale o tédio; tampouco ali onde elas perseguem seu anseio de felicidade, ou onde sua atividade no tempo livre é racional em si mesma, como algo em si pleno de sentido."
Theodor Adorno, Indústria Cultural e Sociedade
p.110

506.

"Desgraciadamente, las citas de la Biblia en boca de hombres de Estado no han constituido hasta ahora experiencias felices."
Herman Hesse, Lecturas Para Minutos, tese 63 

505.

"Só os imbecis tem medo do ridiculo"
Nelson Rodrigues

504.

"Como sugere Jack Herer, no clássico The Emperror Wears No Clothes, essa campanha contra a maconha pode ser vista de outro ângulo: o da guerra da indústria química e petrolífera contra o cânhamo. De fato, essa rese se fortalece com o exemplo de Henry Ford, que construiu um carro de fibra de cânhamo e iria movê-lo com o combustível tirada da semente do próprio cânhamo. Era compreensível o embaraço que significava a existência de um versátil recurso renovável, quando se preparava a arrancada do petróleo como um produto estratégico para a humanidade."
Fernando Gabeira, Folha Explica A Maconha
p.10

503.

Infelizmente não foi possível postar.

502.

Congênito
"Se a gente falasse menos
Talvez compreendesse mais
Teatro, boate, cinema
Qualquer prazer não satisfaz
Palavra figura de espanto
Quanto na terra tento descansar

Mas o tudo que se tem
Não representa nada
Tá na cara
Que o cara tem seu automóvel
E tudo que se tem
Não representa tudo
O puro conteúdo é consideração
Não goza de consideração" 
Luiz Melodia, do disco Maravilhas Contemporâneas

501.

"Outro dia maltratei bastante o valor da linguagem como instrumento expressivo da vida sensível. Agora conto um caso que exprime bem a força dominadora das palavras sobre a sensibilidade. Quem refletia um bocado sobre uma palavra, há-de perceber que mistério poderoso se entocaia nas sílabas dela."
Mário de Andrade, Memória e Assombração
p.161

500!

"Há tantos livros, mas há tão pouco tempo"
Frank Zappa

499.

"Tudo no mundo começou com um sim. Uma molécula disse sim a outra molécula e nasceu a vida"
Clarice Lispector, A Hora da Estrela
p.9

498.

Lenda do Rei Lear

Este rrey Leyr nom ouue filho, mas ouue tres filhas muy fermosas e amaua-as muito. E huum dia ouue sas rrazõoes com ellas e disse-lhes qu lhe dissessem verdade, qual d'ellas o amaua mais. Disse a mayor que nom auia cousa no mundo que tanto amasse como elle; e disse a outra que o amaua tanto como ssy mesma; e disse a terçeira, que era a meor, que o amaua tanto como deue d'amar filha a padre. E elle quis-lhe mal porém, e por esto nom lhe quis dar parte do rreyno. E casou a filha mayor com o duque de Cornoalha, e casou a outra com rrey de Scocia, e nom curou da meor. Mas ela por sa vemtuira casou-se me. lhor que nenhüa das outras, ca se pagou d'ella el-rrey de Framça, e filhou.a por molher. E depois seu padre d'ella em sa velhiçe filharomlhe seus gemros a terra, e foy mallandamte, e ouue a tornar aa merçee d'ell-rrey de Framça e de sa filha, a meor, a que nom quis dar parte do rreyno. E elles reçeberom-no muy bem  derom-lhe todas as cousas que lhe forom mester, e homrrarom-nomentre foy uiuo; e morreo em seu poder.

William Shakespeare. Texto traduzido em Português arcaico, do século XIII ou XIV. Retirado de FARACO, Carlos Alberto. Lingüística Histórica.

497.

"Originalmente era um termo astronômico que designava movimento regular, sistemático e cíclico dos corpos celestes. Seu significado ampliou-se ao ser introduzido no campo semântico da política, passando a designar também movimentos sociais alteradores duma ordem estabelecida. (...) No início dessa expansão semântica o termo tinha um significado de movimento social restaurador duma ordem anterior (ligado ao significado original de ciclo, volta) e, só mais tarde, adquiriu seu significado atual de destruição de uma velha ordem e construção de uma nova."
Carlos Alberto Faraco, Linguística Histórica, sobre a palavra "Revolução"

496.

"Uma consciência clarividente demais, asseguro-vos, senhores, é uma doença, uma doença muito real. Uma consciência ordinária nos basta mais que amplamente em nossa vida cotidiana, ..."
Fiódor Dostoiévski, Melhores Contos, Memórias do Subsolo
p.20

enviada por Clarice Cardoso

495.

De cara Lavada - 177

"hoje me desfiz dos meus bens
vendi o sofá cujo tecido desenhei
e a mesa de jantar onde fizemos planos

o quadro que fica atrás do bar
rifei junto com algumas quinquilharias
da época em que nos juntamos

a tevê e o aparelho de som
foram adquiridos pela vizinha
testemunha do quanto erramos

a cama doei para um asilo
sem olhar pra trás e lembrar
do que ali inventamos

aquele cinzeiro de cobre
foi de brinde com os cristais
e as plantas que não regamos

coube tudo num caminhão de mudança
até a dor que não soubemos curar
mas que um dia vamos"
Martha Medeiros

494.

Claridade

é o fogo,
o artifício,
o cumprimento do ofício
a consciência da prazer.

Claridade é a luz do sol,
raiar de todos os dias na alma
a nova geração,
a pureza,
o verbo,
a reflexão,
a ciência.

Um pavio aceso na escuridão.

Claridade é um rio correndo,
todo o começo,
todo o amor:
é a poesia,
é a música brasileira e todos os amigos do peito

Claridade é Caetano, Gil,
Mautner, Melodia, Chico,
Geraldinho, Luiz Gonzaga,
Luis Ramalho, Zé Ramalho
Amelinha, Vital, Valença
Nené, Jackson do Pandeiro,
Sivuca, Noveli, Schangai,
Tadeu, Bráulio, Umberlino,
Romero, Washington, Dal,
João, Carlinhos Jullien, 
Carlos Fernando, Katia Messel,
de França, Abdias,
Robertinho de Recife,
Milton Nascimento, Paulo Rafael,
Zé da Flauta, Pedro Osmar,
Elomar, Jatobá, Mirabô
Capinan, Paulinho Tapajós,
Nelsinho, Guil, Zé Américo,
Joca, Elber, Marcos Amma,
Mauro Morra, Bebeth,
Beto Ribeiro, Coutinho,
Géu.

Com um beijo,
Elba Ramalho, no encarte do vinil Capim do Vale, 1980 

493.

Esquecimento

"Esse de quem eu era e era meu,
Que foi um sonho e foi realidade,
Que me vestiu a alma de saudade,
Para sempre de mim desapareceu.
Tudo em redor então escureceu,
E foi longínqua toda a claridade!
Ceguei… tateio sombras… que ansiedade!
Apalpo cinzas porque tudo ardeu!
Descem em mim poentes de Novembro…
A sombra dos meus olhos, a escurecer…
Veste de roxo e negro os crisântemos…
E desse que era eu meu já me não lembro…
Ah! a doce agonia de esquecer
A lembrar doidamente o que esquecemos…!"
Florbela Espanca, Charneca em Flor

492.

"A felicidade nunca é grandiosa"
Aldous Huxley, Contraponto

491.

"Ora, quando nós mesmos desejamos dormir, temos o hábito de tentar produzir uma situação semelhante à da experência de Strümpell. Fechamos nossos canais sensoriais mais importantes, os olhos, e tentamos proteger os outros sentidos de todos os estímulos ou qualquer modificação dos estímulos que atuam sobre eles. Então adormecemos, muito embora esse projeto jamais se concretize inteiramente. Não podemos manter os estímulos completamente afastados de nossos órgãos sensoriais, nem podemos suspender inteiramente a excitabilidade de nossos órgõas dos sentidos. O fato de um estímulo razoavelmente poderoso nos despertar a qualquer momento é prova de que 'mesmo no sono a alma está em constante contato com o mundo extracorporal'. Os estímulos sensoriais que chegam até nós durante o sono podem muito bem tornar-se fontes de sonhos."
Sigmund Freud, A Interpretação dos Sonhos
p.46

enviada por Victor Pinto

490.

"Como cristão e como católico, lamento profundamente que um bispo da Igreja Católica tenha um comportamento, eu diria, conservador como esse. Ou seja, não é possível que uma menina estuprada por um padrasto tenha esse filho até porque a menina corria risco de vida. Eu acho que, nesse aspecto, a medicina está mais correta que a Igreja. A medicina fez o que tinha que ser feito: salvar a vida de uma menina de nove anos".
Luís Inácio Lula da Silva

489.

Vê Minha Vida à Luz da Protecção

Vê minha vida à luz da protecção 
que dás disposta a dar-se por amor 
e quando a mãe te deu à luz com dor 
o espírito adensou-se nela então 

o mesmo que em espigas pelo verão 
a negra fronte bela foi compor 
de inverno em voz amarga acusador 
a cuja vista as lágrimas virão 

Meu amor em teu corpo se cinzela 
e dele os outros seres recebem vida 
perante ti criança os que da ferida 

sangram exposta ao mundo que flagela 
A mim foste mais bálsamo porém 
do que as curas balsâmicas que tem." 

Walter Benjamin, Sonetos 

488.

"O primeiro mérito de uma teoria crítica exata é fazer parecerem ridículas, de imediato, todas as demais. (...) Além disso, uma teoria concebida com a finalidade de se tornar geral deve evitar aparecer como visivelmente falsa; logo, não se deve expor ao risco de ser desmentida pela sequência dos fatos. Mas também é preciso que ela seja uma teoria perfeitamente inadmissível. Que ela possa declarar mau, diante da estupefação indignada de todos que o acham bom, o próprio âmago do mundo existente, do qual ela descobriu a natureza exata."
Guy Debord, A sociedade do Espetáculo

487.

"Eu dizia “apareça”, quando apareceu, não esperava. Um dia me beijou e disse “não me esqueça”, foi embora e só esqueci metade. Nada disso tem moral nem tem lição, curto as coisas que acendem e apagam, e se acendem novamente em vão. Será que a gente é louca ou lúcida quando quer que tudo vire música? De qualquer forma, não me queixo, o inesperado quer chegar: eu deixo."
Adriana Calcanhotto

486.

"Goethe jamais foi mau patriota, embora em 1813 não tenha feito hinos nacionalistas. Mas acima do amor à Alemanha, que ele conhecia e amava como ninguém, estava para Goethe o amor à humanidade. Ele foi um cidadão e patriota do mundo internacional do pensamento, da liberdade interior, da consciência intelectual, e nos seus melhores momentos de reflexão ascendia tão alto que o destino dos povos não lhe aparecia mais nos seus detalhes, mas como movimentos submetidos a um Todo."
Hermann Hesse, Sobre a Guerra e a Paz
p.18-19

485.

"As viúvas mais enrustidas da foice e do martelo tentam gritar que a solução para a aguda crise do capitalismo são as antigas ilusões socialistas tão desacreditadas pela história. No último Fórum Social Mundial, em Belém do Pará, até as mangueiras perceberam quão esvaziado está o movimento esquerdista global em plena crise capitalista. A mão invisível que pune financistas inescrupulosos e suas muitas vítimas também golpeou, mortalmente, as pretensões da antiga esquerda de se reerguer como opção ao sistema hegemônico".

Sérgio Malbergier, editor do caderno Dinheiro da Folha de S. Paulo

484.

"A única coisa que temos de nosso é o tempo, do qual gozam até os que não têm morada."
Baltasar Gracián, L´Homme de cour

483.

"Outros participam do grande acontecimento levando a guerra para o seu estúdio, redigindo na mesa de trabalho sangrentas canções de batalha, ou artigos em que se alimenta e atiça o ódio entre os povos. Talvez isso seja o pior de tudo."
Hermann Hesse, Sobre a Guerra e a Paz
p.16

482.

"Conheci poucos lugares onde
reinasse assim o esplendor do incomum.
Cada mesa tão diferente da outra:
um pintor rústico que faz dos dedos
pincéis, dos namorados que já saíram,
com a pressa física do amor,
o velho reformado que lê pela décima vez
o jornal da véspera - ou ainda o que
resgistrará envergonhado esses versos.
Desiguais abismos, maneiras de se
estar só, encontram aqui um abrigo
temporário, senão a própria rasura do tempo."
Manuel de Freitas, no poema Café Santa Cruz
Piauí Ed. 22

481.

"Sempre houve guerra, des que sabemos dos destinos humanos, e não tivemos motivos de pensar que ela tivesse sido eliminada. Foi o hábito de uma longa paz que nos deu essa ilusão. Haverá guerra enquanto a maioria dos homens não puder participar do reino goethiano do espírito. Haverá guerra por muito tempo ainda, talvez para sempre. Mas a superação da guerra é, hoje como sempre, nosso mais nobre objetivo, e a última conseqüência da ética ocidental cristã."
Hermann Hesse, Sobre a Guerra e a Paz
p.20

480.

"Nunca mais acreditei no sexo
sem amor, no amor sem sexo,
na ginásticas sentimentais mais praticadas.

Era nossa, para sempre a república da morte."
Manuel de Freitas, no poema Quebra Costas
Piauí Ed.22

479.

"Cada homem que está no campo de batalha, e diariamente arrisca a vida, tem todo o direito à amargura, ao ódio e à ira momentâneas, também cada político. Mas nós, escritores, artistas, jornalistas ― poderá ser tarefa nossa, piorar o que está ruim, multiplicar o que é feio e lamentável."
Hermann Hesse, Sobre a Guerra e a Paz
p.17

478.

Bacanal
Do Latim Bacchanalis, as festas em homenagem a Baco, deus do vinho e do delírio místico. As festas aconteciam à noite, ao som de flautas, tambores e címbalos. No início, só as mulheres participavam, depois vieram também os homens. Elas corriam pelas ruas e campos, seminuas, algumas carregando fachos e gritando "Euhoe!" (evoé, em português), invocando Euan, um dos apelidos de Baco. 
Reinaldo Pimenta, A Casa da Mãe Joana
p.32

477.

"Outro processo dramático vivido por nossas populações urbanas é sua deculturação. Sua gravidade é quase equivalente à primeira grande deculturação que sofremos, no primeiro século, ao desindianizar os índios, desafricanizar os negros e deseuropeizar o europeu para nos fazermos. Isso resultou numa população de cultura arcaica, mas muito integrada, em que um saber operativo se transmitia de pais a filhos e em que todos viviam um calendário civil regido pela Igreja, dentro de padrões morais bem prescritos.
A questão hoje é mais grave. A luta dentro dessa massa urbana é ferocíssima. Se associam, eventualmente, nos festivais, como o Carnaval e cerimônias de Candomblé, como paixões esportivas co-participadas e como os cultos de desesperados. Esses marginais não devem, porém, ser confundidos com a secular população favelada das grandes cidades, que de fato são suas principais vítimas."
Darcy Ribeiro, O Povo Brasileiro
p.189

476.

"...os que se ocuparam com maior ou menor consciência numa construção internacional da cultura humana, e agora repentinamente querem transportar a guerra para o reino do espírito: todos esses cometem uma injustiça, e um grande erro intelectual. Serviram à humanidade, e acreditaram na existência de uma humanidade internacional, apenas enquanto essa idéia não era contrariada por
nenhum fato brutal, enquanto foi cômodo e natural pensar e agir assim. Mas, agora que a fidelidade àquela maior de todas as idéias implica luta, perigo de vida, ser-ou-não-ser, acovardam-se e cantam no tom que mais agrada ao vizinho."

Hermann Hesse, Sobre a Guerra e a Paz
p.17-18

475.

"Apelo aos Maus

Nada encontro, em progresso, na existência,
porque este Mundo é cópia de outros mundos;
a humilhação é a mesma, é a mesma essência
que torna os homens maus: ― torna-os imundos!

― É horripilante ver que a inteligência
fez-se encerrar nos pélagos mais fundos;
e o mais emocionante é ter consciência
de sermos nós de um mesmo seio oriundos.

Ai, que tristeza infinda há nos caminhos,
e que profundo horror cobre-os de espinhos,
tolhendo a Luz, e a Fé, e a Paz e o Amor...

Quanta amargura!... As guerras fratricidas,
como extinguir, ― das terras pervertidas,
se os homens mais se afastam do criador?"

P. de Petrus, Pensamentos Poéticos
p.38

474.

"Saía barato, o amor. Por não sabermos,
ainda, que teríamos de o pagar a vida inteira
com juros aziagos e versos de demora."
Manuel de Freitas, poema Rua de Montarroio
Piauí Ed. 22

473.

"Outra expressão da criatividade dos favelados é aproveitar a crise das drogas como fontes locais de emprego. Essa 'solução', ainda que tão extravagante e ilegal, reflete a crise da sociedade norte-americana que com seus milhões de drogados produz bilhões de dólares de drogas, cujo excesso derrama aqui. É nessa base que se estrutura o crime organizado, oferecendo uma massa de empregos na própria favela, bem como uma escala de heroicidade dos que o capitaneiam e um padrão de carreira altamente desejável para a criançada."
Darcy Ribeiro, O Povo Brasileiro
p.188

472.

"Exemplar é o comportamento daqueles que se deixam queimar ao sol, só por amor ao bronzeado e, embora o estado de letargia a pleno sol não seja tão prazeroso de maneira nenhuma, e talvez desagradável fisicamente, o certo é que torna as pessoas espiritualmente inativas. O caráter fetichista da mercadoria se apodera, através do bronzeado da pele das pessoas em si; elas se transformam em fetiches para si mesmas. A idéia de que uma garota, graças à sua pele bronzeada, tenha um atrativo erótico especial, é provavelmente apenas uma racionalização. O bronzeado tornou-se um fim em si, mais importante que o flerte para o qual talvez devesse servir em princípio. Quando um funcionário retorna de férias sem ter obtido a cor obrigatória, pode estar certo de que os colegas perguntarão mordazes: 'Mas não estavas de férias?' O fetichismo que medra no tempo livre está sujeito a controles sociais suplementares."

Theodor Adorno, Indústria Cultural e Sociedade

p.108