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"Segundo a mentira triunfante, quando o muro de Berlim caiu, não caiu apenas um símbolo da estupidez humana mas todo um sistema de idéias. E o que venceu não foi o simples desejo de liberdade mas uma concepção econômica, que se sentiu autorizada a ocupar nossa mente com a mesma arrogância de qualquer vencedor em território conquistado. A ocupação, para não ser revertida, precisa neutralizar todas as formas possíveis de resistência, e começou pela linguagem. Subitamente, o que já era chamado de "os velhos chavões da esquerda" transformou-se em folclore e a análise marxista virou mera tese vencida. Além da semântica, o muro de Berlim também caiu em cima da moral e da avaliação de caráter. Tudo que se sabia sobre a rapacidade* do capital internacional, sobre a cumplicidade de organismos como o FMI com a perpetuação do domínio sobre países ricos, sobre todas as formas de colonialismo econômico que condenam os países pobres à subserviência, ficou sob os escombros metafóricos. A crítica sepultada - mesmo amavelmente, como no caso do Brasil - equivale ao sono da razão, de Goya, que gerava monstros. De uma hora para a outra o capitalismo ganhou, além de vastos novos mercados, um prontuário limpo, carta de recomendação (nada o desabona), porte de arma e habeas-corpus preventivo. Também é uma prerrogativa dos vencedores. "
Luis Fernando Verissimo, no Prefácio do livro A Farsa do Neoliberalismo, Nelson Werneck Sodré.

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