451.

"'Por que não' é uma pergunta: por que não usar guitarras elétricas, o cabelo comprido, um suéter laranja de gola rulê em vez de terno escuro? Mas também, por que não continuar a 'linha evolutiva' da música popular brasileira, o trabalho extraordinário de gente como Tom Jobim e João Gilberto, por meio de um diálogo entre o rock e a música erudita, entre Beatles e Webern? E, mais ainda, por que não permanente? Não como uma busca interminável das origens - como quereria o modelo herdado da Europa -, mas sim como uma aposta, permanentemente renovada, na incorporação e elaboração seletiva de estímulos culturais, seja qual for sua procedência. Por que restringir, aprioristicamente, o rol de expreimentos possíveis a serem realizados a partir de uma forma artística determinada?

Mas o modo como a pergunta aparece formulada a torna menos uma interrogação do que uma afirmação escondida. Não se pergunta então, mas se afirma. E aquilo que se afirma é uma negação mantida em suspenso. O dispositivo semântico é complexo: a frase contém uma pergunta que não se expressa como tal, uma afirmação suspensa pelo tom interrogativo, e uma negação contradita pelo caráter afirmativo e inquisitor da proposição. Interessa, sobretudo, o fato de que não se trata de pôr em cena uma pura negatividade, mas uma afirmação dogmática."
Carlos Basualdo, Tropicália, Uma Revolução na Cultura Brasileira
p.15

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